Os responsáveis pela segurança dos navios que trafegam pelo Canal de São Sebastião
Quem vê aqueles navios gigantescos trafegando ou ancorados ao longo do Canal de São Sebastião não tem ideia da habilidade necessária para levá-los até o cais ou desatracá-los para que prossigam a viagem. Se você pensa que esse trabalho é executado pelo comandante da embarcação, está muito enganado. Na verdade, é comandante sim, mas é o comandante da praticagem, uma profissão que exige, acima de qualquer coisa, uma habilidade sem igual para levar esses gigantes do mar por entre as ‘armadilhas’ existentes no fundo do oceano. Em São Sebastião, esta profissão existe desde mais ou menos a década de 60 com a instalação do Porto Organizado na cidade. Mas, diferente de que a maioria pensa, não é qualquer pessoa que pode assumir o comando de um navio de uma hora para outra. Antes de mais nada, é preciso passar por um processo seletivo rigoroso, aliás, rigorosíssimo. Segundo o diretor presidente da Praticagem São Paulo (que envolve os portos de Santos e São Sebastião), Fábio Mello Fontes, diferente do que muita gente pensa, a função de prático não é passada de pai para filho. “Se não passar em processo seletivo não entra”. Para chegar ao estágio de operar no Canal de São Sebastião, é preciso ter pelo menos 100 horas de manobras pelo ‘olho’. Isso mesmo, vendo a atuação dos práticos mais experientes, e depois mais 600 horas na prática, incluindo trabalhos diários e noturnos, isso no Porto de Santos, para depois estagiar na área de São Sebastião por mais um ano antes de assumir o posto. Essas medidas são necessárias, conforme Fontes, devido às peculiaridades do Canal de São Sebastião. “O maior problema por aqui são as correntezas”, explica o comandante Fontes, que mesmo aos 72 anos, pelo menos duas vezes por mês opera as embarcações na cidade. Para um leigo, definir qual a funcionalidade de um prático é muito difícil ou fora da realidade. Alguns acreditam que a função é um conjunto com operadores dos rebocadores, além de várias pessoas no navio a ser atracado. Mas ledo engano, a figura do prático resume-se a um profissional que a partir do momento que uma embarcação cargueira, petrolífera ou de cruzeiro chega próximo ao Canal, assume o seu comando. É esse prático que, literalmente ‘guia’ o navio pelas áreas tortuosas, evitam colisões com alguma pedra, dependendo da localidade, que o mantêm nas águas profundas, evita ou o controla por entre as correntezas. Tudo isso no comando de voz. Seu equipamento mais importante, conforme o comandante Fontes costuma dizer, é o rádio comunicador no qual fala com os pilotos dos rebocadores, com os marinheiros, oficiais das embarcações e mesmo com a lancha que o leva para os navios. Em inglês, ele orienta os oficiais sobre as direções a seguir até levar a embarcação em segurança para os atracadouros ou para mar aberto. Ele português, ele explica aos rebocadores as posições corretas para ‘conduzir’ os navios. Esta operação pode durar, em média, uma duas horas e meia no caso de chegada as embarcações e menor tempo para a saída, isso se a proa estiver na posição correta e de acordo com a situação meteorológica. Para o comandante Tom Ryan, da embarcação petrolífera Vinland, de bandeira escocesa e oficiais canadenses, “a presença de um prático no comando quando a embarcação sai das águas aberta é fundamental ‘devido ao conhecimento que eles têm da região”. Por trás de todo esse processo está toda a logística e estrutura da Praticagem, que funciona 24 horas, tem todos os avisos meteorológicos, e profissionais que precisam conhecer a geografia da região mais do que conhecem a si mesmo. O prático, em geral, tem sua escala programada por mês, mas é faltando pouco mais de uma hora para entrar em operação que sabe que vai assumir uma embarcação. “Somos informados quais os navios que estão previstos para atracação ou saída, e na hora entramos na lancha que sai de uma marina e seguimos para o Canal”, explica Fontes. Em geral, os práticos entram nos grandes navios quando ainda estão em movimento. Por isso, há necessidade do piloto da lancha ser bem preparado para saber o momento certo de ‘encostar’ na embarcação para que o prático possa subir sem risco de queda ou algum tipo de acidente. Em algumas situações, é preciso subir uma parede de cerca de 15 metros de altura com o auxílio de escada de alumínio ou de corda, também conhecida como ‘quebra-peito’. Por que deste nome? Porque ela é solta e se o profissional não segurar bem e o mar estiver revolto, por exemplo, corre o risco de ficar batendo o peito contra o costado da embarcação. Lá dentro, ele passa a ser o principal profissional dentro da sala de comando. Cabendo até ao comandante do navio a sua obediência. “Qualquer erro de cálculo, por mínimo que seja, pode provocar uma tragédia”, explica o presidente da Praticagem São Paulo.
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